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O que é ser um membro do Ministério Público!

 

O que é ser um membro do Ministério Público!

Por vários anos enviei, quando da posse de novos Procuradores da República, alguns textos que entendo como fundamentais para quer ser e se fazer um membro do Ministério Público.

Salvo engano, e sem ordem, acredito que eram quatro textos: Sermão da montanha, Manifesto Comunista, o outro de um autor italiano (Negri?) e o outro que não lembro nem mais de pistas!

 

Percebi, com o passar dos anos, que "as crianças estão vindo cada vez mais precoces para o mundo"! Já nascem sabendo de tudo, inclusive mexer/operar um celular!

O mesmo ocorre com os colegas novos que chegam, sempre sabem mais que os que já estão na carreira a mais tempo, com isso desisti de minhas remessas.

Lembro ainda que, em 2009, escrevi um:

Bilhete a um jovem membro do MP

 

À Rilke , me atrevi te escrever este bilhete, sem o mesmo brilhantismo, contudo. Não vou citar a ministra  pelo que disse do ministro  que também escreveu uma “Carta a um jovem juiz”, imputando-lhe conduta que não deve nortear a atuação dos destinatários.

Vejam: todos os subprocuradores-gerais da República já foram procuradores da República e procuradores regionais da República. Estes já foram procuradores da República. Assim, vocês são o início, realmente, e podem construir todos os fins, mas os outros também já o foram e abriram os caminhos que vós trilhais. Ou não encontraram nada que justifique que houve antecessores?

Para o bem ou para o mal, acredito que sim, que pioneiros existiram. Pois bem, sou como a maioria dos senhores, de ingresso posterior à Constituição de 1988. Fui aprovado no último concurso sob a batuta de Aristides Junqueira Alvarenga. Na casa, como procurador federal dos direitos do cidadão, encontrei Álvaro Augusto Ribeiro da Costa, cuja uma dentre as muitas lições relembro a seguinte: “sobre os ratos, é preciso jogar luz, pois eles temem a claridade”.

Quando cá cheguei/chegando, bem como os demais colegas de concurso, acreditava que o MPF era o ponto de apoio que me faltava para mover o mundo. Ainda acredito nisso, mas já não tanto na minha alavanca! Não que ela tenha “morrido”/quebrado, mas porque ela precisa ser retomada (ajudada) por outros, pois o próprio tempo se encarrega de diminuir as forças do candidato a movedor. O tempo, infelizmente, é o corruptor mais implacável de todos, pois chega a degenerar o próprio corpo e, consequentemente, seus consectários, como a própria beleza!

Mas o tempo também, como sabem (“o silêncio e o tempo são dois mudos que falam”), é o senhor da razão. Também cheguei a pensar que aqueles que me antecederam no Ministério Público nada fizeram por ele. Consequentemente, pela sociedade. Estava enganado, como, de resto, costumo sempre estar. Eu não teria sido capaz de realizar o modesto trabalho institucional que realizei e realizo se não tivesse encontrado o caminho aberto pelos nossos antecessores.

Portanto, respeita os mais velhos, independentemente da idade, pois o que a ti pode ser novidade para eles pode ser apenas a repetição de um filme já visto de há muito. Isso não significa que não possas ser um brilhante cineasta e assim fazer todas as releituras possíveis. Só não tenhas tanta certeza de que todas elas serão as melhores. Então, aceita a divergência, pois, como tu, ninguém é dono da verdade. Lembra-te de que Galileu não acertou todas!

Então me perguntarás: “encontra-te satisfeito? Tua missão está cumprida?” Não, claro que não. Lembras que te convidei para juntar forças na minha palanca? Pois é...

É claro que tenho reservas a pessoas (como elas certamente as têm com relação a mim) e às falhas pontuais da instituição Ministério Público. Mas acredito, acima de tudo, que essas falhas são apenas um incentivador convite às suas correções. E tu, jovem amigo de caminhada, és o convidado privilegiado que irás corrigir o que corrigido precisa ser. Mas, cuidado: és humano e, como tal, padeces das limitações que disso decorre. Portanto, seja altivo e corajoso, mas prudente. Inove, mas procure ver as razões dos vencidos (antecessores). Não erre, mas se errar, procure consertar seu erro. Lembra-te sempre que “não tens compromisso com o erro”. Seja duro no cumprimento do dever, porém não seja soberbo, pois tratas com seres humanos que, além de serem iguais a ti, são teus senhores, pois és um “servidor do público” e o público é o contribuinte que sustenta a ti, tua esposa, teus filhos e teus pais, muitas vezes. Mesmo que não fosse, respeita-o em sua dignidade. Não te niveles com o criminoso por baixo, exatamente descumprindo a lei para prejudicá-lo.

Não persiga o forte por essa sua simples condição que o sistema lhe permitiu, nem por inveja. Mas também não persiga o fraco por essa sua condição. Também não se curve àquele por aquela condição, nem a este por piedade. Não deves temer a nada, a não ser a possibilidade de cometeres injustiça contra ambos. Por isso não os olhes por suas condições, mas pela falta que cometeram.

Assim, não condenes antecipadamente os que te antecederam, pois, no mínimo, eles te deixaram os seus erros, exatamente para que tu não voltes a cometê-los.

   

Não és o carpinteiro de teu próprio berço, não importa se ele é de madeira dura ou de plumas. O importante é que deixes um melhor para teus filhos, no caso, que deixes um Ministério Público melhor para aqueles que, inelutavelmente, te sucederão.

Do Osório Barbosa, procurador da República.”.

Dia desses pensei em enviar o acima para uma nova colega de carreira. E o fiz, mas acrescentei:

"Bem vinda, colega! Que sejas feliz nesta casa em que entras pela porta da frente, a única que deve estar aberta a todoas!”.

Não satisfeito, lembrei do discurso que o Dr. Geraldo Brindeiro fez por 8 anos quando exerceu o cargo de procurador-geral da República e, parece, pouco aprendemos, que é "O Ministério Público e a Constituição de 1988"!

Fui à dita Constituição Federal e de lá pincei, à Jack, o seguinte no estilo "amar é...":

"Se fazer e SER membro do Ministério Público é:

- Servir à República e aos seus fins e objetivos (perguntar-se sempre antes de agir: minha conduta é republicana? Se não for, abstenha-se de praticá-la, pois deve ser ilegal ou ilegítima).

- Ler e praticar e guiar-se pelos seguintes dispositivos da Constituição de 1988:

- Art. 127. O Ministério Público é 

instituição permanente,

essencial à função jurisdicional do Estado,

incumbindo-lhe

a defesa da ordem jurídica,

do regime democrático

e dos interesses sociais e individuais.

- Art. 129 - São funções institucionais do Ministério Público:

...

II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia."

É o suficiente, pois já é um trabalho hercúleo, para ser e merecer ser um membro do Ministério Público!

De tudo isso, contudo, o Princípio Democrático é o que se irradia sobre todos os demais, em conjunto com o Republicano, pois neles está o Princípio da Isonomia, da igualdade, que é a única e possível possibilidade daquilo que chamamos de justiça!

Igualdade em todos os sentidos deve ser a meta do membro do Ministério Público em seu atuar! 

Essa a regra que entendo fundamental!".

Descobri que é fácil ser e querer ser um Membro do Ministério Público, basta, para tanto, seguir as determinações constitucionais.

E para ser membro do Ministério Público é muito fácil e bom!

É fácil sim, basta estudar e ser aprovado nos concursos anuais, nos quais, todos os anos, sobram vagas.

É bom por a Instituição remuneração condignamente seus membros.

Mas, a título de arremate, digo:

- membro do Ministério Público, com a Constituição de 1988 deixou de ser “justiceiro”, passando à condição de Magistrado! É para e por isso que recebeu as garantias constitucionais com que hoje conta.

- o membro do Ministério Público não deve ser aquele acusador implacável retratado em romances e filmes, sempre a acusar todos, inclusive inocentes, vindo dessa última “função” a malquerença contra a carreira.

- alguns membros do Ministério Público regozijam-se até de injustiças que cometeram, pois entendem que cumpriam seu dever!

- finalmente, deve ou deveria o membro do Ministério Público, melhor que as demais pessoas, saber que uma mera prisão não faz “coisa julgada” condenando o preso! Isso é coisa de pessoas ignorantes e de má-fé que pregam, e alguns acreditam, que a “polícia prende e a justiça solta” (já tratei disso em: http://osoriobarbosa.com.br/node/933).

Até mais,

 



Rainer Maria Rilke, poeta alemão que escreveu “Carta a um jovem poeta”.

Eliana Calmon. Fonte: O Estado de São Paulo, 22/11/2009.

César Asfor Rocha.