Livros que Li

Você está aqui: Home | Livros | Livros que Li

Quase tudo – Danuza Leão

Dia desses, sábado, 26.11.05, para ser mais preciso, após os olhos estarem cansados de uma leitura técnica, comecei a folhear e, consequentemente, ler, o último livro da Danuza Leão. Mesmo, inicialmente, com muito sono, cheguei à página 64, não fui mais adiante por que no dia seguinte, muito cedo, tinha um compromisso inadiável.

Meu caso de amor com a autora já vence mais de quinze anos. Nosso romance difere de todos os outros, especialmente dos tradicionais à Juieta e Romeu, Isolda e Tristão e Eloisa e Abelardo, por exemplo. É que o nosso affair é virtual, enquanto de um lado eu me dedico a ela, do outro, a Danuza nem sabe da minha existência, mas, o que fazer? Segundo a própria Dan (viu como sou íntimo?), “quando amam, as mulheres são todas iguais”. Oh, amour, os homens também!

Em uma das minhas crises de amor, quase tentei as drogas, contudo, de novo lembrei que ela, de maneira curta e grossa, disse: “não se pode confiar em ninguém que se droga.” Parei na hora! Antes de começar.

Minha musa é, além de tudo honesta, pois chega a admitir que: “era bem bonita - hoje me dou conta”, é o preço da praga do tempo. Preço, no entanto, que gostamos de pagar, já que, do contrário, não teremos tempo sequer de olhar para o espelho. Dan, como você se dá conta, eu também me dou conta que você é cada uma daquelas lindas mulheres cujas fotos ornamentam seu livro, é você navegando (surfando, diria um carioca) no tempo!

Como foram felizes Richard Avedon e S, A, R!

Não me interessa o que “contam as más línguas da família”, se é que contam algo sobre você, prefiro ouvir de sua própria boca sobre você e o mundo. Por isso tenho paciência, espero a chegada da Folha aos domingos sempre ansioso para ouvi-la. Minha alma levita enquanto sussurras todas as tuas sábias lições. Tão precisas quanto o corte do bisturi bem afiado.

Nossos caminhos, mesmo distantes, se tangenciam em alguns momentos. Exemplo?

Quando comemos galinha você diz que “quando a travessa chegava com a galinha acompanhada de polenta, que na minha terra se chama angu, vinham junto a moela, o coração, o fígado e um cacho de ovinhos de vários tamanhos”, me encheste de saudade, mas não de inveja, uma vez que também brigava pelas partes citadas e ouvia meu pai reclamar pelo fato da galinha não ter várias moelas e/ou corações.

Talvez nosso amor tenha dado tão certo ao longo destes anos porque sei que chegaste “à conclusão de que não nasci para ser casada”. Penso que eu também, mas não vamos mexer em time que está ganhando.

Embora não reclamemos dos nossos, sei que “mãe não se escolhe; amigos e amores também não”, embora, depois do tempo passado, se pudéssemos, não que desejemos voltar atrás, mas, certamente, em especial em relação aos dois últimos (amigos e amores) faríamos algumas coisas diferente. Eu, por exemplo, em vez de São Paulo, poderia ter ido para o Rio, quem sabe, uma hora dessas, poderia dirigir seu carro quando você saísse da manicure e enquanto suas unhas secavam e, assim, dizer-te que...

Também “sou incapaz de desperdiçar luz ou água”. Aliás, vou mais longe, procuro reciclar todo meu lixo, profissional e doméstico. Precisas de orientação sobre isso? Em caso positivo, me liga.

Foi muito bom saber “que as glórias e honrarias deste mundo não têm nada a ver com a felicidade”, como não as tive, achavam que poderiam ser o mais curto caminho. Obrigado. Eu acredito em você!

Até bem pouco tempo, Górgias (negando), Platão e Sócrates (afirmando), diziam que as palavras foram feitas para mostrar, ou demonstrar, o pensamento. Vem você e me diz: “as palavras foram feitas para esconder os pensamentos”! Sei não, precisamos conversar pessoalmente sobre isso, preciso de mais luzes.

Semelhante a você, também nunca tive, quando criança, “festas de aniversário”, não “por convicção do meu pai”, mas por pobreza mesmo. “‘Datas’? Mas que importância têm as datas?", embora não tenha ouvido isso “a vida inteira”, procurei fazer isso lema da minha vida.

Quando descreves um dos teus ex-maridos, dizes que ele vivia: “permanentemente interessado em conquistar todas as mulheres do mundo. Ele não podia ver uma: a tentativa de sedução era automática, mais forte que ele”. Tens certeza que não falas de mim? Acredite, é duro confessar, especialmente por parte de quem quer conquistar que sou daqueles homens que “toda mulher deveria conhecer um homem assim na vida. Menos nossas filhas, claro”. Sorry!

Sempre acreditei em conselhos, veja como em alguma coisa não somos parecidos. Lembro que você disse que ao pedir um conselho de: “Vinícius, que era diplomata de carreira e acabara de chegar para assumir um posto na embaixada do Brasil, mesmo não tendo nada de repressor, me disse para tomar cuidado, que era perigoso, que eu não entrasse naquela, mas não liguei muito”. Eu acreditaria nele. Mas, se combinássemos 100%, acho que seria muito chato, pois não seríamos nós mesmos, porém cópia um do outro.

Quando você confessa: “a experiência com heroína poderia ter me destruído”, ganhei um milhão de motivos para dela não me aproximar.

“Fui sofrendo e aprendendo o que era a vida, bem como meu pai dizia”, quando você diz isso, lembro de dois ditos antigos: É a dor que ensina a gemer e conselho e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. E os ovinhos em cacho, então!

Engraçado, o tempo passa e as notícias continuam as mesmas. Relembremos esta: “‘Danuza conquista Paris’. Não era bem assim, mas os brasileiros acreditaram”. Hoje, ainda, é dito o mesmo de várias tops brasileiras!

Por falar em tops, você assevera que “o maior costureiro da história da moda foi Balenciaga”. Mas quem foi Balenciaga? Hoje não se ouve falar dele.

As mentiras da televisão, as quais a gente nunca pode desmentir, são terríveis, mais para o mal que para o bem. Lembro que você conta que: “outra coisa inventada por Flávio [Cavalcanti] foi dar ‘tarefas’ para o júri — tudo combinado antes, claro”. E a gente, do outro lado, acreditando que as pegadinhas são verdadeiras. Como somos ingênuos.

Gosto de uns tragos, e compartilhamos o mesmo do mesmo defeito (ou seria até uma virtude?). Ao dizer: “bebo mal: como sou ansiosa, bebo depressa demais, e por isso a noite para mim termina cedo”, pensei, novamente, que estivesse descrevendo meu modo de ser. Parece que estamos sempre com muita sede. É bom, por um lado, por não ficarmos enchendo a paciência dos outros.

“Quero abrir aqui um parêntesis: sempre trabalhei no que apareceu, sem jamais achar que eu era muito importante para o que me ofereciam, ou que o salário que ia ganhar não era tão bom assim. Estava sem fazer nada, topava qualquer trabalho, e acho que essa maneira de ver as coisas me ajudou muito na vida. Se tivesse nascido rica, seria muito infeliz; não tenho essa vocação, já disse”. Essa é uma lição para a vida toda. Obrigado, por mais uma.

“Apesar de gostar muito de mim, Renato não podia — e continua sem poder ver um rabo-de-saia.” Renato uma ova, é de mim que você está falando!

Ao pedir emprego para seu filho, dizendo: “implorei que levasse Bruno, nem que fosse para varrer o set; eu pagaria a viagem e o salário, (nem precisou), para ver se ele encontrava um rumo na vida”, no serviço público você seria chamada de nepotista. O importante é que o Bruno encontrou o seu rumo.

“Lá no fundo talvez eu achasse que, o dia em que uma mulher vestisse um lindo vestido de Chanel e usasse esmeraldas, tudo mudaria, ela passaria a ser outra, mas a verdade é que nada muda e você volta a ser a mesma pessoa de antes”. O invólucro não muda o conteúdo, Dan.

“E percebi o quanto é injusto, na juventude, sobretudo quando se começa a fazer análise, julgar nossos pais culpados de tudo: eu caí nesse erro, Nara também. Não passa pela nossa cabeça jovem que eles são o produto da infância que tiveram, da maneira como foram criados, o que também tem a ver com a maneira como foram criados nossos avós etc. etc., e que essa história não acaba nunca. Até uma certa idade se pode botar a culpa de tudo nos pais. Quando se é jovem, essa atitude pode até parecer simpática, mas mais tarde perde toda a sua atração”. Que profundo! Tomara que todos os moços acreditem em você

“Saturnino, o homem que desmoralizou a honradez”, só mesmo o Millôr para sair com esta. Invejo-a: ser amiga de Millôr, Vinicíus, Chico e tantos outros, é... um sonho. Ou será que eles é que são felizes por serem seus amigos? Vou conceder um pouco: ambos os casos.                           

“A competição entre as atrizes”, “fogueira de vaidades sem limites”, estes são outros temas que o tempo não muda!

Quem foi mesmo o diretor do qual você pediu uma carona ele disse: "Não vai dar"? Quero fazer uns pontos contra ele.

Você também concorda que a imprensa, muitas vezes, não tem a mínima sensibilidade? “Afastar a imprensa, que poderia ser um pouco mais discreta nessa hora”, na hora de dor pela perda de um familiar. Concordo, como não poderia deixar de ser, com você.

“Geralmente, quando uma fonte liga para um colunista para dar uma nota, é para favorecer alguém ou prejudicar outro alguém”. Esse jogo mesquinho é terrível, mas muitos alimentam isso. Infelizmente.

“Por mais que uma coluna procure ser isenta e imparcial, somos todos humanos, temos nossas simpatias e antipatias, e isso numa coluna fica logo evidente”. Engraçado, jornalista parece que nunca erra. Errados são sempre os outros. Quando admitem o erro são em letras minúsculas para que ninguém os leia!

"Esse rapaz [Tom Jobim], minha filha, lá fora ninguém sabe quem é; só aqui algumas pessoas o conhecem”. Embora você discorde disto, francamente, Dan, também não vou muito com a música do maestro. Perdoe-me mais este defeito.

“Vi uma chiquérrima de cuja vida devassa todos sabiam, voltar para o final da fila e comungar de novo”. Neste caso, não quero saber quem era, mas, as chiquérrimas, geralmente, não são devassas?

Detesto grandes festas de casamento, se “verdadeiros patrimônios são torrados para que os noivos sejam felizes para sempre, o que não costuma acontecer”, e o que é pior, sempre tem um ... para sair falando mal.

“Há cerca de dois anos quebrei um braço e fiquei no gesso por dois meses; durante esse tempo, só podia usar duas ou três camisetas grandes, que já tinha. Foi quando descobri que não preciso de tantas coisas materiais para viver; não que não goste de ter roupas bonitas, adoro e vou adorar sempre, mas não dependo delas para ser feliz”. Dan, com perdão da palavra, seu pensamento é muito masculino. Talvez seja por isso que a admiro tanto. Sem futilidade. Aviso: não sou metro nem übersexual!

Chegou a hora das confissões. Você diz: “meu maior defeito: a falta de paciência”. Eu acrescento: o meu também.

Se “poucos homens compreendem as mulheres; não sabem que muitas preferem ser desejadas a ser amadas”, e como você não me conhece, informo: estou dentre aqueles que figuram na primeira hipótese.

É isso, Dan, não saia por aí sozinha, como gostas de ficar, eu posso aparecer em sua vida, dizer tudo que penso e sinto e ... ir embora, você vai sentir saudades, mesmo sabendo que “as razões que levam uma mulher a se apaixonar por um homem, são as mesmas que a levam a um dia, abandoná-lo”.

Aceitas um vinho? Sou cavalheiro o suficiente para, pelo menos, uma taça.

Beijos,

Osório Barbosa

(As frases entre aspas são da Danuza Leão no seu livro “Quase Tudo”, da Cia das Letras, 2005. Eu li, como podem ver, e AMEI).

Você está aqui: Home | Livros | Livros que Li