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Garrafas salvam poesia do naufrágio.

 

 

 Garrafas salvam poesia do naufrágio.

 

   Garrafas etc

Thor Rio Apa cria poemas que depois de engarrafados podem ser encontrados por turistas e moradores das praias

 

JoséRodrigues

 

Embarcar no veleiro Sonho em Santa Catarina, navegar pela costa brasileira vivendo de brisa e de poesia pode parecer coisa de poeta. E é. Thor Rio Apa está de volta ao litoral paulista divulgando seus poemas de uma forma pouco comum: ele lança seus versos dentro de garrafas que, um dia, serão recolhidas por um turista ou morador nas praias. Essa experiência é realizada há cerca de dez anos e o retorno, confirmado pelas cartas que recebe, está por volta de 10%, o que o incentiva a continuar semeando a surpresa de encontrar um bilhete dentro de uma garrafa, como os náufragos fazem em filmes. Ou ainda, entalhando versos em pedras à beira-mar.

Desta vez, a tripulação do Sonho é formada por poetas do grupo Epopéia, que tem sede em Curitiba. Quando o veleiro pára em alguma marina, chega a hora de conseguir o dinheiro para sustentar a viagem. E o produto é poesia, vendida no formato de livretos ou em folders nas portas de shopping centers e lugares de grande movimento de público. Desde que o grupo foi formado, seus integrantes vivem assim, dos poemas que escrevem.

"Nunca se escreveu tanta poesia quanto hoje", comenta Thor Rio Apa, ao mesmo tempo em que a divulgação não encontra espaço na mídia nem nas prateleiras das livrarias. "É uma necessidade interior das pessoas, que escrevem para liberar a sensibilidade e guardam seus poemas", afirma. Ele mesmo é contra a publicação de poemas em livros.

"Ninguém lê um livro de poesia", diz Thor Rio Apa, apontando para a necessidade de outras formas de divulgação. Foi daí que surgiu a idéia de conciliar seu gosto pela navegação com a distribuição de versos em garrafas lançadas ao mar, bem antes do lançamento do filme Mens@gem para Você, de Nora Ephron, de 1998.

"Aquela garrafa vai ser encontrada por uma pessoa que terá esse momento único na vida. Certamente, vai ler o poema, vai senti-lo, e nosso objetivo estará alcançado." Há uma sincronicidade, entende Thor. "A pessoa encontra o poema que vai ser dela, que pode não ter uma relação direta com ela, mas é muito fantasioso."

Nesses anos todos, ele já lançou 3 mil garrafas e pelo menos 300 delas foram encontradas por pessoas que estavam nas praias. Isso porque elas escrevem demonstrando a emoção do encontro, apóiam a iniciativa.

Colecionas mensagens de retorno da Bahia ao Rio Grande do Sul. Mas recebeu uma também questionando se não seria antiecológico atirar garrafas ao mar. Ele não tem respostas, a não ser a que está tatuada em seu ombro: "Eu só sonho."

Além de encontrar versos curtos dentro das garrafas, como "eu te vi/toquei/gaivotas voaram de seus olhos" ou "mar/solidão/azul", as pessoas podem se surpreender também com versos entalhados em pedras nas praias. "Beber no copo torto/inclinar o horizonte/com a verdade do vinho" é um que Thor espera deixar numa das pedras existentes no litoral paulista. Ele confessa que não tem mais fôlego para usar a entalhadeira e comprou um equipamento que torna menos penoso o ofício de escrever em pedra. "O ambiente é muito agressivo e esses poemas duram pouco na pedra, mas ficarão guardados na mente de quem os leu."

 

EPOPÉIA

Na viagem que faz atualmente pelo litoral paulista, Thor Rio Apa, que vive na sossegada Praia da Pinheira, a 40 quilômetros de Florianópolis, está acompanhado pelo filho Nuhr e por um grupo de poetas do movimento Epopéia, de Curitiba. Ao longo desses últimos dez anos, seus membros conseguiram provar que dá para viver de poesia no Brasil. Eles editam um livreto em papel cuchê, de 8 a 16 páginas ilustradas e que são oferecidos às pessoas nas portas de shopping centers, em feiras de artesanato em troca de uma contribuição.

Como os versos lançados dentro das garrafas são curtos, como o de Dyane Silva: "Espelho partido/mil faces/do mesmo disfarce." Ou o de Alecsander Mattos: "Não tão cedo/e não tarde tanto/que tudo seja apenas e só/por enquanto..." Ao todo, são seis os participantes do grupo Epopéia, cujos livretos estão no número 10, com mais de 150 mil exemplares. a penúltima edição vendeu 30 mil exemplares, impressos aos poucos. "Cada exemplar custa R$ 0,30 e a contribuição é espontânea, vai de R$ 1 a R$ 5", comenta Cristiano Farias, ator de teatro. Todos eles vivem exclusivamente da poesia e viajam pelo Brasil escrevendo e vendendo seu produto. "Dá para tirar uns R$ 700 por mês", conta o poeta Cristiano Farias, de 28 anos.

Fonte: Estadão, 28.06.06.

 

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