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Ciência (o que ela é?)

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Uma das frases preferidas dos estudiosos afetados é: "isso é científico", com a qual aprovam um trabalho; também adoram o sentido oposto da mesma frase: "isso não é científico", que funciona como o atestado de óbito de um entendimento. A primeira sentença é um endeusamento de um pensamento, o seu oposto é a condenação ao fogo do inferno, esquecendo aqueles que as utilizam que a própria ciência é um trabalho humano, logo...

O que se entende tradicionalmente por ciência é aquela atividade (humana) que conta, mede e pesa, à qual alguns querem agregar as ciências ditas sociais. Porém, é difícil enfrentar um grande e elementar problema: como medir o grau de satisfação da admiração que tenho pela atriz de minha preferência, por exemplo?

 

Não se deve esquecer que o método com que se mede, conta-se ou pesa-se, fazendo-se o que se entende por ciência, é uma criação humana: a matemática, que já foi chamada a linguagem dos deuses, como se os deuses, até cerca do ano 1.200 d. C., tivessem vivido sem conhecer o zero!

A máquina mais inteligente inventada pelo homem trabalha com o sistema binário (0 e 1), ou aceso e apagado. Ou seja, duas informações, apenas. Seriam duas palavras?

Pois bem, os gregos, por volta de dois mil e quinhentos anos antes de Cristo perceberam que podiam dividir a matéria. Assim, apanharam uma barra de chocolate suíço e começaram a dividi-la:

Metade para Leucipo e a outra metade para Demócrito, disse o mais velho.

Leucipo, mestre de Demócrito, comeu somente a metade da metade que lhe coube, guardando a metade que sobrou. No dia seguinte, voltaram a dividir aquela parte que Leucipo guardara. Novamente, o mestre voltou a dividir sua parte e comera apenas uma delas, guardando a outra.

O traquinas do Demócrito, no dia seguinte, sugeriu ao mestre nova divisão, no que foi atendido.

Um mês depois, quando tentaram uma nova divisão, viram que tal era impossível, pois o pedaço que sobrara da barra de chocolate era tão pequeno que eles não conseguiam dividí-lo, sequer chegavam a vê-lo. A esse pedaço indivisível deram o nome de átomo (átomo, em grego, quer dizer, indivisível). Átomo, assim, passou a ser entendido como a menor partícula que compõe a matéria (ou de que a matéria é constituída).

O cientista Inglês Robert Hook propôs a Newton a explicação da matéria, especialmente dos gases, pelo movimento e colisão dos átomos. Daí em diante, a ciência não abandonou mais a existência dos átomos, muito pelo contrário, conseguiu dividi-lo (tal fato se deu em 1939, e foi efetuado por cientistas alemães). Demonstrou-se que o átomo é composto por várias partículas: elétrons, prótons, nêutrons e quarks.

Outros gregos, os epicuristas, tinham proposto que os átomos estão em constante movimento. Os físicos atômicos modernos tiveram que admitir a existência do movimento das partículas quânticas, movimentos esses que não seguem uma trajetória pré-definida e constante, ao contrário, é totalmente aleatória.

Em 1927, o alemão Werner Heinsenberg propôs que é impossível medir uma grandeza, especialmente porque, em partículas quânticas, a própria força do instrumento utilizado para medir faz com que o objeto a ser medido se desloque, impossibilitando qualquer medição!

Eis algumas explicações para o que hoje é conhecido como Princípio da incerteza de Heisenberg:

"O princípio de Heisenberg é bem simples, filosoficamente até desce redondo, faz muito sentido: o simples fato de observar altera a natureza do observado". (Fonte: http://www.thinksofter.com/2007/02/o-princpio-de-heisenberg.html, acesso em: 28.11.09).

E,

"O físico alemão Werner Heisenberg (1901-1976) foi o primeiro a descobrir este princípio básico de incerteza, que leva seu nome. O princípio de incerteza de Heisenberg afirma que não se pode medir com exatidão, ao mesmo tempo, a posição e a velocidade de um objeto, seja este objeto o que for. Essa impossibilidade não deriva de que nossos instrumentos de medição não sejam, todavia, o suficientemente refinados e precisos, senão da natureza mesma das coisas, da natureza da própria matéria.

Esta incerteza é muito relevante quando se trata de objetos com massas muito pequenas, como átomos ou partículas. A mecânica de Newton, todavia, se aplica ao mundo das coisas grandes, como os planetas ou as pessoas. No caso de uma coisa muito pequena, o objetivo de, digamos, medir a velocidade de elétron empurrará e moverá dito elétron de modo que sua posição não poderá calcular-se, nem sequer teoricamente. Esta incerteza se encontra também em outros pares de elementos de observação, como a energia e o tempo. Se se busca medir exatamente a quantidade de energia que irradia o núcleo instável, por exemplo, não se poderá medir a duração do sistema instável, embora faça sua transição para um estado mais estável.

..........................

O que está em jogo aqui não é uma questão teológica senão a assunção fundamental que subjaz a todo o tipo de ciência. Fizemos bem em mencionar a hipótese original de Tales mais de uma vez e não é demais repeti-la: o universo exterior está conformado à semelhança de nossa mente e imaginação e, em conseqüência, o intelecto humano é capaz de compreender o mundo. Existem tantas razões para crer que essa teoria é correta, desde o resplendor da bomba atômica em Hiroshima às criações da engenharia genética, que parece que colocá-la em dúvida nos deve conduzir à loucura. Porém a teoria do Big Bang faz com que me pergunte acerca de nossa capacidade de compreender o verdadeiro núcleo das coisas. Podemos descrever o acontecimento inclusive até seus detalhes matemáticos mais belos, porém o compreendemos? Tem algum sentido? E se não o tem, então tem em último termo, sentido o próprio universo?"

Fonte: Charles Van Doren, Breve Historia del Saber (La cultura al alcance de todos), Planeta, Barcelona: 2006, pp. 479/481.

E,

"Resumidamente, pode-se dizer que tudo se passa de forma que, quanto mais precisamente se medir uma grandeza, forçosamente mais será imprecisa a medida da grandeza correspondente, chamada de canonicamente conjugada.

Algumas pessoas consideram mais fácil o entendimento através da analogia. Para se descobrir a posição de uma bola de plástico dentro de um quarto escuro, podemos emitir algum tipo de radiação e deduzir a posição da bola através das ondas que "batem" na bola e voltam. Se quisermos calcular a velocidade de um automóvel, podemos fazer com que ele atravesse dois feixes de luz, e calcular o tempo que ele levou entre um feixe e outro. Nem radiação nem a luz conseguem interferir de modo significativo na posição da bola, nem alterar a velocidade do automóvel. Mas podem interferir muito tanto na posição quanto na velocidade de um elétron, pois aí a diferença de tamanho entre o fóton de luz e o elétron é pequena. Seria, mais ou menos, como fazer o automóvel ter de atravessar dois troncos de árvores (o que certamente alteraria sua velocidade), ou jogar água dentro do quarto escuro, para deduzir a localização da bola através das pequenas ondas que baterão no objeto e voltarão; mas a água pode empurrar a bola mais para a frente, alterando sua posição". (Fonte:

 

http://pt.wikipedia.org/wiki/Princ%C3%ADpio_da_incerteza_de_Heisenberg , acesso em: 28.11.08).

E,

"Um dos pilares da Mecânica Quântica é o princípio da incerteza de Heisenberg. De acordo com este princípio, para prever a posição e velocidade futuras de uma partícula é necessário poder medir a posição e velocidade atuais. Para se observar a partícula é necessário fazer incidir sobre ela um raio de luz, por exemplo.

Se o comprimento de onda do raio (fóton) for longo, ou seja, menos energético, perturbará menos o movimento da partícula e será possível conhecer a sua velocidade com alguma precisão. Todavia, não conseguimos determinar a posição da partícula com maior rigor do que a distância entre cristas de onda sucessivas. Sendo o comprimento de onda longo, essa distância será maior e, portanto, maior será também a incerteza quanto à posição da partícula. O oposto ocorrerá se fizermos incidir um raio com um comprimento de onda mais curto: perturbará mais o movimento da partícula (tornando mais incerta a sua velocidade), mas permitirá localizá-la com maior precisão.

O princípio da incerteza tem implicações profundas na forma como vemos o mundo. É impossível prever acontecimentos futuros com precisão, dado não ser possível medir com precisão o estado do Universo. A Mecânica Quântica prevê vários resultados possíveis para uma observação, cada um com a sua probabilidade e, portanto, informa-nos acerca das probabilidades de cada um dos futuros estados possíveis do mundo". (Fonte: http://www.dsc.ufcg.edu.br/~gmcc/mq/incerteza.html, acesso em: 28.11.08).

Ampliando o princípio para estendê-lo às ciências humanas, temos:

"HEISENBERG Werner Karl (1901-1976) é um dos mais importantes físicos alemães. Por seus trabalhos sobre a mecânica quântica recebeu o Prêmio Nobel em 1932.

Do ponto de vista filosófico, seus trabalhos contestaram o modelo determinista. Em 1927, Heisenberg formula suas ‘relações de incerteza’, que tentam regular as relações entre a previsão teórica do movimento das partículas elementares e a medição experimental.

Heisenberg mostra que uma partícula é afetada por um componente de posição e por um componente de movimento. Quanto mais se procura conhecer com precisão um desses dois componentes, mais difícil fica conhecer o outro. A localização absoluta de uma partícula acarretaria uma indeterminação total quanto ao movimento dessa partícula, e vice-versa.

Heisenberg mostrou que essa limitação do saber nada tem que ver com a imprecisão dos instrumentos de medição. As limitações quânticas do conhecimento incidem sobre qualquer experiência possível na área dos fenômenos microfísicos. A relação de incerteza é inevitável. Não é questão de dispositivo. Trata-se de um limite às nossas possibilidades de conhecimento.

Heisenberg constata que o processo de medição deve ser pensado como interação entre um objeto quântico (a partícula) e um objeto macroscópico (o dispositivo de medição). As relações de incerteza delimitam a modificação imprevisível do movimento das partículas acarretado por essa interação. A experimentação não fornece, pois, dados objetivos, mas constitui uma intervenção subjetiva do cientista no curso dos fenômenos. Logo, o conhecimento supõe um desarranjo, uma perturbação do fenômeno que ele almeja atingir. Portanto, só há conhecimento no desarranjo.

O que Heisenberg mostra é que a limitação do conhecimento já não provém dos limites do sujeito. A limitação do conhecimento constitui uma lei física cuja fórmula produzimos, demonstramos e verificamos. A limitação não é um ‘conhecimento menor’, é um conhecimento positivo, parte necessária da determinação positiva das leis dos sistemas microfísicos.

Assim, Heisenberg produziu uma teoria dos dispositivos de experimentação; essa teoria pode ser estendida ao campo das ciências humanas, nas quais a relação perturbadora do pesquisador com relação ao seu objeto tem ao menos a mesma importância que nas ciências físicas. A análise da implicação do pesquisador com relação ao seu objeto se torna uma condição da pesquisa das ciências humanas. Não é possível aceitar uma proposição sociológica ou psicológica sem ter a perspectiva do lugar de onde foi emitida. Aí também, o dispositivo de pesquisa modifica o que ele estuda."

(Pierre Vancraeÿenest, na obra, Dicionário dos Filósofos, organizada por Denis Huisman, Martins Fontes, São Paulo: 2001, pp. 479-480).

Como se pode ver, embora sem querer dar razão aos céticos (pois até eles, contraditoriamente têm uma certeza: a de que o conhecimento é impossível, no que se chama, em lógica, de autocontradição performativa), a afirmativa de inclusão/exclusão (é ou não é científico) está longe de ser científica, pois, se a linguagem que mais se aproxima das "certezas" que se admitem como científicas não é capaz sequer de medir a matéria, é melhor reciclarmos nossos julgamentos.

Como explicar, por exemplo, que uma ponte, construída com todos os cálculos matemáticos possíveis e imagináveis, caiu? Como explicar que uma nave espacial explodiu? Por que os programas da Microsoft não rodam, já que são construídos por milhares de engenheiros?

A experimentação é uma das grandes chaves do conhecimento, embora devamos também saber que experiência e resultado nem sempre dão certo. Exemplo: escravidão nos Estados Unidos.

Grandes descobertas ditas científicas ocorrem por acaso. A pólvora, pelos chineses, e o raio-x, por exemplo. Tudo a demonstrar que primeiro vem a prática, depois os esforços da teoria.

De Lucrécio já foi dito que ele "não cometeu o erro de humilhar seus leitores e seguidores, pela simplicidade" com que expôs seu pensamento. Isso me levou ao "pentelho" do Sócrates que era um chato tão grande que acabou como acabou, e sabem por quê? Por ser um irritante e inconveniente por tudo querer saber. Como seus (nossos) interlocutores não sabiam (sabem) responder aos seus desconcertantes questionamentos, deixando transparecer a máscara da ignorância, decidiram que era melhor matar quem vê que o rei está nu!

Filósofos, quando chegam no limite de seus conhecimentos e não sabem mais explicar o assunto, começam com a embromação do falar ininteligível. Com os religiosos não se passa diferente, já que entregam o inexplicável nas mãos de Deus.

Platão acertou quando disse que o filósofo é apenas "amigo" da sabedoria (quer conhecê-la), já que ela pertence mesmo apenas à divindade, no que acabou se juntando aos religiosos.

Não quero com isso dizer que as religiões não são necessárias, pois são, já que conseguem pôr um freio em grande número de celerados, que sem a religião não se contentariam em respeitar os demais.

Nunca deveria ter lido o livro Teoria do Conhecimento, de Johannes Hessen, pois ele consegue desconstruir e destruir qualquer pretensão que se tenha, até a presente data, de certeza do conhecimento. O livro, contudo, serve para rirmos daqueles que posam de donos da verdade, seja em seus escritos, seja nas suas palestras.

Também é um túmulo para a teoria da linguagem o livro Filosofia Aristotélica da Linguagem, de Fausto dos Santos.

As duas obras me fecharam as portas a qualquer pretensão ao saber e à admiração por todos os mestres que passaram pela minha vida pregando a existência da verdade. Pobre de mim!

Resta-me, contudo, a certeza pela incerteza, o que não deixa de ser um consolo, uma tábua de salvação para o oceano de dúvidas em que me encontro!

O importante, até hoje, na história do conhecimento, é saber perguntar, já que ninguém ainda conseguiu às coisas mais simples responder.

Disse tudo isso para afirmar que nossos julgamentos estão prenhes de ideologia, em que o viés político (és ou não partidário das minhas idiossincrasias?) é que determina a aceitação ou não do pensamento de outrem.

Osório Barbosa
procurador da República e mestre em Direito Constitucional/PUC-SP

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