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ACP - governador Mestrinho e outros - Sambódromo

BRASO
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO AMAZONAS

EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) JUIZ (A) FEDERAL DA VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO AMAZONAS.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República no final assinado, com base no art. 129, III c/c 37, caput e § 5º e art. 70, § único da Constituição Federal, art. 159 do CC e art. 1º, IV da Lei nº 7.347/85, vem propor, em defesa do patrimônio público e de direitos difusos e coletivos,

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

 

contra o Governo do Estado do Amazonas, que poderá ser citado na pessoa do Procurador-Geral do Estado, sito à Rua Emílio Moreira, s/nº, Praça 14 de Janeiro,

e os seguintes litisconsortes passivos necessários:

  • A Construtora COMAGI Ltda., na pessoa de seu representante legal, o sr. Paulo Girardi, o qual poderá ser citado na sede da empresa, à Avenida Constantino Nery, nº 2480, Chapada ;
  • O sr. Gilberto Mestrinho Medeiros Raposo, ex-Governador do Estado do Amazonas, que poderá receber citação no Congresso Nacional – Senado Federal, na Praça dos Três Poderes, em Brasília-DF;
  • O sr. Orígenes Angelitino Martins, ex-Secretário Estadual de Educação, que poderá ser citado na sede do Colégio CIEC – Centro Educacional Christus do Amazonas, à Avenida Djalma Batista, nº 1151;
  • O sr. Elpídio Gomes da Silva Filho, ex-Secretário Estadual de Transportes, que poderá receber citação na Rua Adelson Veras, nº 315, apto. 701, Parque 10 de Novembro;
  • O sr. Josué Cláudio de Souza Filho, ex-Secretário Estadual de Educação, o qual poderá ser citado na sede da Rádio Difusora F.M., sito à Avenida Eduardo Ribeiro, nº 639, Ed. Palácio do Comércio, Centro.

motivo pelo qual expõe e, afinal, requer o seguinte:

DA LEGITIMIDADE ATIVA

O art. 129, III da Carta Magna, aduz que:

"Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

.............................................

III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos."

A Lei nº 7.347/85, que disciplina a ação civil pública, no seu art. 1º, IV, por sua vez, traz que:

"Art. 1º. Regem-se pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

.............................................

IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo"

 

DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

Segundo o disposto no art. 109, I da Constituição, verbis:

"Art. 109 – Aos juízes federais compete processar e julgar:

I – As causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.

Assim, a Justiça Federal é absolutamente competente para processar e julgar ação civil pública (Lei 7.347/85, arts. 2º e 21 c/c Lei 8.078/90, art. 93 e CF/88, art. 109, I), nas causas propostas pelo Ministério Público Federal – cujo interesse público da União se presume – ou por qualquer das entidades referidas no art. 109, I, da Constituição, bem assim, nas ações propostas, em face dessas pessoas, por quaisquer autores, qualquer que seja a sua natureza jurídica.

Ainda, mais se firma a competência da Justiça Federal pelo fato, que adiante se demonstrará, de que as irregularidades objeto da presente ação foram cometidas em detrimento de convênios firmados com órgãos federais, como o Ministério de Educação e Cultura (MEC – FNDE), relacionado-se com a irregular e faltosa prestação de contas perante o Tribunal de Contas da União - TCU.

DOS FATOS

O Governo do Estado do Amazonas firmou, com o MEC-FNDE, os Convênios nºs 425/91, 4.209/91, 526/92 e 4.919/92, cada qual no valor de C

r$ 500.000.000,00, Cr$ 2.650.000.000,00, Cr$ 4.500.000.000,00 e Cr$ 20.000.000.000,00, respectivamente, os quais tinham como objeto a construção do Centro Cultural de Manaus (Sambódromo).

Fiscalizando a execução dos referidos convênios, o Tribunal de Contas da União - Secretaria de Controle Externo no Amazonas apresentou Relatório no Processo TC- 225.179/93-8, onde se constata, em suma, dentre muitas outras relativas a outros convênios, as seguintes irregularidades:

"Trata o processo de relatório de levantamento de auditoria realizada no Governo do Estado do Amazonas em relação aos convênios firmados com o Governo Federal abrangendo os Ministérios da Educação, Cultura e Desportos, Saúde, Ministério do Bem Estar Social e outros, incluindo a SUFRAMA como grande beneficiadora.

Dado o grande volume de recursos que envolviam os convênios a equipe de inspeção deteve-se praticamente no termo firmado para a construção do complexo Educacional.

1.2 Referido termo foi acrescido de 17 termos aditivos onde se verificaram irregularidades as mais diversas, como realização de obra onde o metro quadrado da suposta sala de aula chegou ao elevadíssimo percentual de 1.154,15% mais caro que custo estabelecido pelo SINDUSCON, média já considerada alta (US$350,00/m2).

- realização de obras de grande vulto sem a obrigatória licitação, dispensada com base no art. 22, IV, V e art. 24 do Decreto-lei nº 2300/86 (item 2.1.5).

- prorrogações sucessivas dos termos de convênios,

contrariando o disposto no art. 47, I do supracitado Documento legal (item 2.1.8).

- pagamento de sucessivas parcelas das obras sem a correspondente medição e atestação dos engenheiros fiscais responsáveis (itens 2.1.17)

- pagamento efetuado com recursos oriundos do convênio MEC/FNDE/SEDUC por obras efetuadas antes da celebração do convênio (itens 2.1.9, 2.1.29, 2.2.10).

- Desvirtuamento no objeto do convênio arquibancada do módulo D e H (item 2.1.26).

- Descumprimento de cláusulas do convênio no 425/91 (item 2.1.33).

- Repasse integral dos recursos a construtora na mesma data de autorização dos serviços, ou seja, pagamentos antecipados (itens 2.1.39).

pagamentos efetuados com base em planilhas que discriminam serviços que já haviam sido realizados com recursos de convênios anteriores, (item 2.1.40)

- Celebração de convênios entre o MEC/FNDE/SEDUC em que no curto prazo de 20 dias foram liberados os recursos e efetuados o pagamento da ordem de 20 bilhões de cruzeiros referentes a construção de 20 salas de aula.

- processo de liquidação para efeito de pagamento realizado pela própria construtora (item 2.2.12).

- superfaturamento na construção das supostas salas de aula. O custo unitário foi 11,55 vezes mais caro que o preço executado pelo SINDUSCON. As obras custaram para os cofres públicos 1.154,15% a mais.

- negligência do gestor em relação à aplicação dos recursos, deixando-se desvalorizar em 7 meses (itens 2.3.3/ 2,3,1 l).

...........................................................................

3. Considerando as graves falhas observadas propôs-se o encaminhamento do processo ao Tribunal com proposta de:

- transformação em Tomada de Contas Especial para efeito de

citação dos responsáveis tendo em vista as irregularidades apontadas.

- citação de diversos responsáveis identificados para que recolhessem ou apresentassem alegações de defesa por débitos quantificados (...)

4. Em despacho de 25.1.94 o Ministro-Relator Luciano Brandão determinou que fosse promovida a audiência dos responsáveis, nos termos do inciso 11 do art. 43 da citada Lei (Lei nº 7.990/89), a respeito de todos os requisitos julgados necessários pela SECEX/AM.

............................................................

7. Os ofícios nºs 14 e 15 encaminhados aos Secretários de Educação e dos Transportes e Obras questionaram os seguintes fatos:

Não realização do processo licitatório destinado a contratação de empresa para a realização de obras na chamada Ala Cultural ou Bumbódromo (Sambódromo), pertinentes aos Convênios firmados entre o FNDE e o GE/AM, de nº 425/91, valor Cr$ 500.000.000,00, nº 4209/91, valor Cr$ 2.650.000.000,00; nº 562/92, valor Cr$ 4.500.000.000,00; e nº 4919, valor Cr$ 20.000.000.000,00, vez que a empresa, que realizou as obras- Construtora COMAGI LTDA- foi contratada em 3.3.1988 com o fim específico de realizar as obras da "Vila Olímpica"

2- Pagamento indevido à Construtora COMAGI LTDA, relativo a obras e reajuste de faturas concernentes a parte da obra da "Ala Cultural", com recursos do Convênio nº 425/91 de 13.6.1991 (Cr$ 500.000.000,00) e nº 4209/91 de 27.11.1991 (2.650.000.000,00), quando a realização das ditas obras teriam sido executadas da 6ª/l3ª medição, considerando que de acordo com os Mapas de Acompanhamento de Obras, essas medições foram realizadas no período de 26.10.1990 a 26.05.91, portanto 8 meses antes da existência do 1º convênio com o MEC.

3- Pagamento antecipado no valor de Cr$ 4.500.000.000,00 efetuado à Construtora COMAGI LTDA, concernente aos recursos do convênio MEC/FNDE nº 562/92, e relacionados as faturas de nºs 000989 e 00990, vez que a autorização para o início das obras é do dia 29.12.92, data em que o convênio mantido entre a SEDUC e a SETRAN nº 47/92 foi firmado;

4- Inexistência nos processos de pagamentos da obra "Ala Cultural", dos formulários utilizados para quantificar as medições, procedidas após a 6ª medição, quando as susocitadas obras passaram a ser pagas com recursos oriundos do convênio mantido com o FNDE;

5- Inexistência de medições nos processos de pagamentos relativos a construção de 20 salas de aula (Faturas COMAGI LTDA nº 1145 no valor de Cr$ 67.269.672,58; nº 1146, no valor de Cr$ 9.932.730.412,66; nº 1147 no valor de Cr$ 67.269.678,28; e nº 1148 no valor de Cr$ 9.932.731.254,30),

6- Esclarecer a realização de obras correspondentes a 20 salas aulas em prazo recorde de 8 dias (Convênio MEC/FNDE/SEDUC/Nº 4919/92), vez que o convênio de nº 105/92-SEDUC/SETRAN foi firmado em 29.12.92 e as obras entregues em 10.01.93;

7- Divergência entre o relatório de acompanhamento físico da obra "Ala Cultural" (Convênio MEC/FNDE/SEDUC/Nº 425/91) e o descrito nas faturas correspondentes as ditas obras, vez que no primeiro documento consta "Serviços executados nas arquibancadas dos módulos D e H" e no segundo, "serviços executados nas salas de aula"-

8- Atestação pela própria Construtora COMAGI de que os serviços nas obras "Ala Cultural" foram realizados, servindo esta para efeito de liquidação da despesa, em desacordo com o art.63 da Lei nº 4320/64;

Elevado custo do m2 das salas construídas na "Ala Cultural", vez que dos recursos recebidos (U$ 7.780.113,85) e m2 construidos (1.926 m2), tem-se o custo do m2 em U$ 4.039,51, quando nos cálculos do SINDUSCOM o m2 sairia a U$ 350,00;

.............................................

  1. Quanto ao item 1 esclareceu o Secretário que o prosseguimento às obras da Ala Cultural do Bumbódromo, foi efetivado com base em contrato já existente, com fulcro no art.22, inciso IV e V do Decreto-lei nº 2300/86, vestido de legitimidade pelo Decreto Estadual nº 13129/90, o qual está marcado pelo princípio da legalidade, cuja validade e eficácia autorizam a produção dos efeitos jurídicos.

7.1.1 Argúi o responsável que é legítimo o ato administrativo que tem como fonte o direito e como limite a finalidade pública, aqui traduzida pela execução do extraordinário complexo centro desportivo sócio-cultural-educacional, objeto de reconhecido prestígio.

7.1.2 A justificativa não procede. O inciso V do artigo 22 do Decreto Lei 2300/86 permite a dispensa de licitação quando houver comprovada necessidade e conveniência administrativa na contratação direta, para complementação da obra, observado o limite previsto no parágrafo 1º do art.55 que no caso de obras seria de até 25% do valor inicial do contrato.

7.1.3 O inciso IVcita casos de emergência, quando caracterizado urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança, de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares.

7.1.4 Embora de valoração subjetiva, o reconhecimento da emergência há de estar baseado em fatos consumados ou íminentes, comprovados ou previstos, que justifiquem a dispensa de licitação ou seja, a obra deve estar relacionada com uma anormalidade que a Administração visa corrigir ou com o prejuízo a ser evitado.

7.1.5 Configuram casos de emergência por exemplo, o rompimento de um conduto de água, a queda de uma ponte, a ocorrência de um surto epidémico, a quebra de máquinas ou equipamentos que paralise ou retarde o servido público ou quaisquer outros eventos ou acidentes que transtornem a vida da comunidade e exigem prontas providências da administração, circunscritas à deliberação de perigo ou à atenuação dos danos à pessoa e/ou bens públicos ou particulares (Hely Lopes Meirelles, Licitação e Contratos Administrativos).

      1. A urgência alegada no caso, confirma o relatório, devia-se à proximidade dos desfiles de carnaval que deveriam ser realizados na obra em questão, o que não justifica em hipótese alguma a urgência da obra, dada a inexistência de qualquer dado que aponte para uma situação de emergência.

7.1.7 Além do mais, o projeto da Vila Olímpica, obra para a qual foi contratada a empresa inicialmente, nada tem a ver com a denominada Ala Cultural ou Bumbódromo que está localizada em torno de 200 metros da Vila Olímpica, separada por um córrego.

      1. A Vila Olímpica começou a ser construída em 1988 e após a conclusão

solicitou-se, após dispensa de licitação, renovar o contrato com a Construtora COMAGI para que esta executasse uma nova obra, denominada de Ala Cultural.

7.1.9 Em síntese, aditou-se um contrato a outro que tinha objeto distinto, com recursos provenientes de convênios o que é totalmente vedado pela IN nº 03/90 vigente á época dos termos em questão (item 9 subitem 9.3).

7.2 Relativamente ao item 2 o responsável tenta justificar o pagamento indevido à COMAGI Ltda, mediante faturas que tinham datas anteriores a existência do convênio, com o desarrazoado argumento de que o elemento temporal da data do pagamento com recursos do convênio não tem o condão de tornar ilegítimo o pagamento da obra efetivamente executada e que interpretar de forma diversa privilegiaria a forma em detrimento do fundo, enalteceria o rótulo em prejuízo do conteúdo, posto que a obra foi efetivamente executada.

7.2.1 Os argumentos apresentados não merecem análise mais detida. O subitem 9.5 da IN/STN nº 03/90 dispôs com muita clareza sobre a vedação de realização de despesas em data anterior ou posterior à vigência dos convênios.

7.2.2 O impedimento é cristalino. Descabido furtar-se ao seu entendimento ou buscar interpretaçõs que dissimulem atos ilegítimos.

Quanto ao item 3, constou por lapso no oficio de diligência, a data da celebração do convênio como sendo 29.12.92 mas efetivamente questionou-se no relatório o fato de  ter sido o convênio firmado em 4.6.92, e em 5.6.92 o valor ter sido repassado à SETRAN e pago a COMAGI o valor das faturas que referiam-se aos serviços de obras na Ala Cultural e respectivos reajustes.

7.3.1 Ao defender-se o responsável alega que em sendo a data de celebração do convênio 04.6.1992 e não 29.12.92 tal como foi consignado no item, e tendo o pagamento ocorrido a 5.6.1992 não há como caracterizar pagamento antecipado pois tal só ocorre, quando a Administração procede a liquidação da despesa antes da execução da obra, ou de etapa dela, hipótese que segundo seu entendimento foi posto, apenas como elemento de argumentação.

7.3.2 Considerando que o pagamento foi executado no dia seguinte à celebração do convênio, indubitavelmente infringiu-se aí o art.62 e os parágrafos 1º e art.63 da Lei nº 4320/64 pois que, não se verificou se o implemento de condição foi cumprido, ou seja não se comprovou o direito do credor ao pagamento ou o cumprimento da obrigação contratual.

7.3.3 "Nada na Lei nº 4320/64 impede o pagamento de uma parcela por antecipação, mas a Administração deve precatar-se com cláusula contratual que garanta a realização da obra ou serviço, ou em caso contrario, multa por inadimplemento contratual."

7.4 Relativamente ao item 4 o Secretário esclareceu que o corpo de fiscais que atesta a execução da obra e/ou serviço e ao final emite o laudo técnico, é designada por ato formal e próprio do titular da pasta e que este ato integra o respectivo processo, sendo ao final submetido aos órgãos de controle externo, mas não justifica o fato de não existirem as medições retromencionadas.

7.5 No que se refere ao item 5 o responsável encaminha cópia das medições (fls. 14/16 e 23/25) contudo não sanam a impropriedade posto que foram elaboradas pela construtora, não especificam o período a que se referem o serviço e não tem assinatura do fiscal da obra, portanto são documentos que merecem suspeição por não esclarecerem os fatos.

7.6. Em relação ao item 6 onde se questionava a realização de obras correspondentes a 20 salas de aula em prazo recorde de

8 dias, vez que o convênio de nº 47 SEDUC/SETRAN foi firmado em 29.12.92 e as obras entregues em 10.01.93, onde se lê nº 47 deveria constar nº 105.

7.6.1 Aproveitando-se do equívoco o Secretário arguiu inicialmente que não se tratava de recorde mas de equívoco datilográfico, porque o convênio de que se trata (47) foi celebrado em 4.6.1992.

7.6.2 Retificado o erro mediante o ofício nº 58 às fls. 438, o Secretário alegou ser irrelevante o prazo de execução, pois que o fundamental é o atingimento da finalidade a que se propôs o acordo,

7.6.3 A seu ver, a consideração de que os recursos da União, via convênio, não poderiam ser utilizados para liquidação de despesas já assumidas pelo Estado, não é importante.

7.6.4 Se os recursos forem empregados na execução dos objetivos resta a conduta legitimada pelo fim atingido e a certeza de que o erário não sofreu desvio de rota.

7.6.5 Os argumentos apresentados não invalidam o que foi registrado pela equipe. 0 convênio entre o MEC/FNDE/SEDUC foi assinado em 20.12.1992 e em 29 e 30.12, foram creditados os recursos na conta da SEDUC, que por sua vez no dia 29.12.1992

assinou convênio com a SETRAN e pagou a Construtora COMAGI Ltda, as faturas de nº 1145 no valor de Cr$ 67.269.672,58, nº 1146, no valor de Cr$ 9.932.730.412,66, nº 1147, no valor de Cr$ 67.269.678,28 e nº 1148 de Cr$ 9.932.731.254,30 toda referentes a serviços realizados e reajustes, de acordo com planilhas elaboradas pel própria Construtora.

7.6.6 Entre a data da assinatura do convênio firmado pela SEDUC/SETRAN e a construção de 20 salas de aula pela Construtora COMAGI Ltda decorreram apenas 8 dias.

7.6.7 No primeiro convênio (nº 425/91, Cr$ 500.000.000,00) a Secretaria de Educação justifica o investimento alegando que seriam construidas 20 salas de aula, após a conclusão do projeto.

7.6.8 Nosegundo convênio de nº 4209/91 no valor de Cr$ 2.650.000.000,00 a SEDUC justifica a aprovação do pleito junto ao MEC alegando a continuação da construção de mais 21 salas de aula no Complexo Educacional.

7.6.9 No quarto convênio de nº 4919/92 no valor de Cr$ 20.000.000,00 a justificativa da SEDUC foi a construção de mais 20 salas de aula.

7.6.10 Nos documentos de prestação de contas consta que os valores dos quatro convênios foram aplicados nas obras dos módulos D e H e C e G.

7.6.11 Contudo, ao visitarem as obras, a equipe constatou a existência de apenas 4 salas de (10X7,30)m e 6 salas de (7,30 X 6,00) m em cada um dos módulos D e H e 9 salas de (7 X 6)m em cada um dos módulos C e G, perfazendo um total de 38 salas nos quatro módulos.

7.6.12 Porém, pelo que consta dos projetos apresentados pelo MEC, deveriam existir 61 salas nos módulos D , H , C e G.

7.6.13 Além disso, os mapas de acompanhamento das obras feitos pelos engenheiros fiscais, evidenciaram que com os recursos dos dois primeiros convênios, foram pagos serviços executados 8 meses antes da execução.

7.6.14 Inclusive existem processos de pagamento onde os serviços dados como realizados e apresentadas para efeito de liquidação das faturas foram elaborados pela própria construtora (fis. 149/176).

7.7 Relativamente ao item 7 o responsável sustenta que não houve divergência pois que o Centro Cultural constitui-se de salas de aula que tem como cobertura as arquibancadas dos módulos D e H, tem as mesmas fundações e infraestrutura. A peça é única mas com funções operacionais distintas. Assim, tem-se um duplo aproveitamento de toda a área.

7.8 Quanto ao item 8 o Secretário desenvolve o argumento de que a SETRAN há muito padronizou seus procedimentos,neles se enquadrando a liquidação de despesa.

7.8.1 A justificativa nada esclarece, não traz qualquer dado consistente.

  1. Quanto ao item 9 o elevado custo do m2 das salas se justifica, segundo o Secretário, na medida em que a obra possui características atípicas, e por isso não pode ser tomada como paradigma para outra obra ou vice-versa.

7.9.1 A justificativa carece de sustentação. À época da inspeção a equipe efetuou pesquisa junto ao SINDUSCON e constatou que caso a obra fosse executada por esses cálculos o custo total seria de US$ 350,00 o m2 ou seja 1.154% mais barato do que o m2 realizado. Logo a obra custaria US$ 674.000 pelos cálculos da SINDUSCON quando custou aos cofres públicos US$ 7.780.113,85.

7.10 Relativamente ao item 10, a não aplicação por 7 meses dos recursos do convênio MEC 1160/92, o responsável justifica que a obra relativa a esse termo vinha de contrato assinado na Administração anterior e estava praticamente paralisada face o baixo desempenho da contratada, que tinha pendências com o Estado, por isso foram sustados quaisquer pagamentos até que a situação se regularizasse e acrescentou que depois da utilização dos recursos pelo convênio, o Estado concluiu a obra usando somente recursos próprios sem auxílio da união.

7.10.1 O argumento explica a situação mas não justifica a impropriedade havida.

7.10.2 Num período em que se verificou um índice de inflação acumulada em torno de 650% (09/92 a 04/93) nenhum esclarecimento possui o condão de justificar a permanência de Cr$ 368.960.000,00 estagnados numa conta sem qualquer correção. Quanto ao fato de não terem sido utilizados recursos da União em nada alteram a impropriedade ocorrida. Os recursos do Estado são igualmente públicos e merecem o mesmo zelo.

.......................................................................

CONCLUSÃO

Ante todo o exposto, sou pelo encaminhamento do processo ao Gabinete do Ministro-Relator com as seguintes propostas:

I- Transformação do processo em Tomada de Contas Especial de acordo com o art.197 do RI/TCU.

II- Citação dos responsáveis que se seguem para que no prazo de 15 dias, contados de ciência, apresentem defesa ou recolham aos cofres da União, os valores abaixo discriminados, acrescidos dos encargos legais calculados nos termos de legislação vigente, de acordo com o estabelecido no inciso II do art.12 do LO/TCU combinado com o inciso II do art.153 do RI/TCU." (sem grifos no original)

DOS RESPONSÁVEIS E DOS VALORES DEVIDOS

O Sr. Gilberto Mestrinho Medeiros Raposo, ex-Governador do Estado do Amazonas, pelos valores integrais dos quatro convênios;

 

  • OsSrs. Orígenes Angelitino Martins, ex-Secretário Estadual de Educação e Elpídio Gomes da Silva Filho, ex-Secretário Estadual de Transportes solidariamente pelos valores:

 

 

- Cr$ 500.000.000,00 divididos em duas parcelas de Cr$150.000.000,00 e mais duas de Cr$ 100.000.000,00 liberadas respectivamente em 18.6.91, 18.7.91, 16.8.91 e 4.9.91 (Convênio nº 425/91-FNDE/MEC);

- Cr$ 2.650.000.000,00 a partir de 5.12.91 (Convênio nº 4209/91-FNDE/MEC);

- Cr$ 4.500.000.000,00 a partir de 28.5.92 (Convênio nº 562/92-FNDE/MEC);

 

  • Os Srs. Josué Cláudio de Souza Filho, ex-Secretário Estadual de Educação e Elpídio Gomes da Silva Filho, ex-Secretário Estadual de Transportes, solidariamente, no valor de Cr$ 20.000.000.000,00 divididos em duas parcelas de Cr$ 10.000.000.000,00 sendo da 1ªa partir de 27.12.92 e a 2ª a partir de 30.12.92, pela não realização de processo licitatório para as obras na chamada "Ala Cultural", relativa ao Convênio nº 4919/92 – FNDE/MEC;

 

 

DO DIREITO

Os gestores públicos, ao fazerem mal uso do dinheiro público por eles gerido, causaram dano à toda a população do Estado do Amazonas que, ao pagar em dia e com sacrifícios seus impostos, têm o direito de vê-los convertidos em obras que a beneficiem, sendo bem aplicados, com honestidade e justiça pelos governantes.

Assim agindo, suas condutas encontram ressonância na obrigatoriedade de reparar o dano estatuído no art. 159 do Código Civil, o qual deve ser lido extrapolando a perspectiva meramente privatística da matéria. De fato, assim preceitua aquele dispositivo:

"Art. 159 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano."

Violaram, ainda, os princípios que regem a Administração Público, elencados no caput do art. 37 da Constituição Federal de 1988, verbis:

"Art. 37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, e também, ao seguinte..."

Devendo-se-lhes aplicar o disposto no § 5º do mesmo dispositivo, que aduz:

"§ 5º - A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento."

(grifamos)

De fato, o dano causado deveu-se também à irregular prestação de contas dos valores recebidos através dos Convênios supra citados. Sobre o tema, doutrina Hely Lopes Meirelles, em "Direito Administrativo Brasileiro":

"O dever de prestar contas é decorrência natural da administração como encargo de gestão de bens e interesses alheios. Se o administrar corresponde ao desempenho de um mandato de zelo e conservação de bens e interesses de outrem, manifesto é que quem o exerce deverá prestar constas ao proprietário. No caso do administrador público, esse dever ainda mais se alteia, porque a gestão se refere aos bens e interesses da coletividade e assume um caráter de múnus público, isto é, de um encargo para com a comunidade. Daí o dever de todo o administrador público - agente político ou simples funcionário - de prestar contas de sua gestão administrativa, e nesse sentido é a orientação de nossos Tribunais."

(23ª Edição. São Paulo: Malheiros)

 

Portanto, o dever de prestar contas é corolário natural dos princípios da moralidade e da publicidade dos atos da administração pública, e o descumprimento de qualquer formalidade relativa à publicidade do ato, além de viciá-lo de morte, implica séria lesão àqueles princípios norteadores da administração pública previstos no art. 37 da Constituição Federal, aos quais já nos referimos acima.

Assim, aplica-se também ao caso em questão o disposto no art. 70, § único da Constituição Federal, que diz:

"Art. 70 - ................................................

§ único

Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária."

Obviamente que tal dever de prestar contas significa prestá-las corretamente e não parcialmente ou com preços superfaturados, como no caso em tela.

DAS PROVAS

Muito embora os fatos estejam absolutamente provados mediante os documentos anexos, protesta o Ministério Público Federal pela produção de prova testemunhal e pericial, bem como juntada de novos documentos, consistente em peças solicitadas a outros órgãos públicos.

DO PEDIDO

Requer o MPF a citação dos réus para, querendo, virem contestar a presente, sob pena de revelia;

  1. Requer, também, a oitiva da testemunha abaixo arrolada, em dia e hora a serem designados, sob as cominações legais;

3. Requer seja requisitada cópia integral do Processo de Tomada de Contas relativo aos convênios citados, junto ao Tribunal de Contas da União; e

4. No mérito, requer sejam os réus condenados a devolver as importâncias acima discriminadas, devidamente corrigidas.

Dá-se a presente o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

Pede deferimento.

Manaus, 08 de julho de 1999.

Osório Barbosa
PROCURADOR DA REPÚBLICA

Anexo: Representação nº 99.1000210-5, em 473 laudas.

Testemunha: Fada Montecorrado Lacorte Raposo da Câmara – Analista de Finanças e Controle Externo do Tribunal de Contas da União, lotada na Secretaria de Controle Externo do Estado do Amazonas, sito à Av. Joaquim Nabuco, s/nº, Centro.